terça-feira, 26 de fevereiro de 2008

As pessoas, às vezes, decepcionam...


1) Como a dócil esposa do síndico, uma carismática e simpática senhora com quem freqüentemente se cruza pelos corredores e com a qual se troca cumprimentos e sorrisos. Dia desses, por volta das 10h, eis que se resolve subir até seu apartamento para informações sobre manutenções feitas nos interfones dos apartamentos.
Morando só, há pouca intimidade com vizinhos; então a idéia mais óbvia é recorrer aos préstimos do síndico.
Toca-se a campainha e quem atende é a babá. Pergunta-se então, diretamente a esta, se os técnicos vêm naquele dia. Ela resolve verificar com a patroa e pede da parte de qual apartamento é a dúvida. A patroa que, está ao fundo, e de quem, de início, só se ouve a voz. Porém, resolve aproximar-se e, de imadiato, inicia um "brado retumbante":
- Os caras estiveram lá na tua porta, bateram um monte e, como não tinha ninguém, vieram aqui encher o saco e ... ... ... ... ...
Pois é... enquanto seu cérebro toca a nona sinfonia de Beethoven, a boca dela continua a se mexer sem parar e as expressões que ela faz são de alguém que está numa crise histérica alucinada logo após ter sido atacada por um enxame de abelhas africanas! Cabe a quem assiste esperar toda aquela música acabar e responder calmamente: "Era uma pergunta simples de 'sim ou não'. Mas muito obrigada, mesmo assim."
Enfim, ela não é tão dócil e simpática como se imagina.

2) Ou como a amiga que se conhece há, pelo menos, 7 anos, tendo o maior prazer em conversar sobre ciência, literatura, cinema, músicas, moda, cosméticos, as próprias vidas... ou seja, tudo, afinal, leu-se a palavra "amiga" ali em cima. De repente ela chega, depois de alguns meses, e começa a falar algumas coisas totalmente sem sentido. Frases desprovidas de qualquer significado válido a qualquer daquelas pessoas pertencentes à chamada 'Cúpula' (ela ainda existe?). Propaga-se pelo ar coisas como:
- Não vou mais a nenhum restaurante que não tenha maître...
- Fazia tempo que eu não vinha pra esses lados; como tem gente feia por aqui, né?
- Não estou mais no nível de beber qualquer coisa... de champagne pra cima, por favor, né?
Teriam, por acaso, abduzido a moça inteligente e culta e no lugar dela colocado o equivalente brasileiro à Paris Hilton com um toque de 'recém-rica' de novela das oito?

Well... Como cantava Mr. Big no clássico Wild World:
Just remember there´s a lot of bad and beware!
Beware!!!
Pois algumas pessoas simplesmente não têm sensibilidade, não têm educação e respeito! Algumas pessoas não têm consideração, não têm a mínima capacidade de se colocar no lugar dos outros!
E cada vez mais o ser humano segue a tendência absurda de ir além dos limites toleráveis para o egoísmo, para a futilidade, para a falta de dicernimento e para a estupidez.
Às vezes as pessoas decepcionam. E dá vontade até de mudar de planeta, de cavar um buraco e se meter nele até a raiva passar. Porque a voz simplesmente falta e o nó desce seco goela abaixo. "Por que elas, então, não se calam?" (diria um célebre político de língua espanhola).
Sabe-se lá... Vai ver essas pessoas, no seu íntimo, até possuem suas razões pra agirem com tamanha insensatez.

Oh baby, baby it´s a wild world...


* Agradeço e repasso os seguintes presentes:






para:




para:

sábado, 23 de fevereiro de 2008

Às vezes, Caio...


Subi correndo no primeiro bonde, sem esperar que parasse, sem saber para onde ia. Meu caminho, pensei confuso, meu caminho não cabe nos trilhos de um bonde. *
Estamos sentados a uma distância de mais ou menos 5 metros. Tem muita gente entre nós. Eu acho que o reconheço pela camiseta. Ele adora esta camiseta. Mas ele também não se importa muito com modas e estilos. Raramente compra algo pra vestir. Só quando realmente precisa. Sapatos então... usa até gastar.
Mas seria tão indelicado referir-me a seus sapatos de pano como uma imperfeição...*
Os tênis parecem que estão se desintegrando por algum corrosivo químico. Não importa. Eu gosto assim.
Não, você não sabe, você não sabe como tentei me interessar pelo desinteressantíssimo.*
Acho que, mesmo não pensando em estilo, ele consegue impor um estilo bem característico. E foi isso que me fez olhar pra ele com interesse. E é engraçada essa falta de vaidade. O cabelo não vê um pente há anos. A barba só é feita quando já tá arranhando demais o pescoço.
...sentiu a luz acesa do interior da casa filtrada pelo vidro cair sobre sua cara de barba por fazer, três dias.*
Só tem uma coisa que ele não dispensa: o perfume. E como eu gosto daquele perfume. Só dele.
Mergulho no cheiro que não defino, você me embala dentro dos seus braços, você cobre com a boca meus ouvidos entupidos de buzinas, versos interrompidos, escapamentos abertos, tilintar de telefones, máquinas de escrever, ruídos eletrônicos, britadeiras de concreto...*
Não lembro de conhecer outra pessoa que use o mesmo perfume- e ele o usa há anos. E jura que não usa quando perguntam. Diz que é o amaciante da roupa ou o sabonete. Acho que pelo jeitão dele, as pessoas acabam acreditando. Ninguém diria que ele passa perfume antes de sair de casa.
E gosto das tuas histórias. E gosto da tua pessoa. Dá um certo trabalho decodificar todas as emoções contraditórias, confusas, somá-las, diminuí-las e tirar essa síntese numa palavra só, esta: gosto.*
Pois é... ele tem suas extravagâncias. Prefere vinhos italianos, adora Häagen-Dazs, lê os livros em seu idioma original (inglês, francês ou espanhol) porque diz que a tradução distorce o sentido real das palavras.
Num deserto de almas também desertas, uma alma especial reconhece de imediato a outra.*
São esquisitices que o tornam único. Principalmente porque quase ninguém sabe dessas particularidades. Ele não é arrogante, nem gosta de se exibir. E eu, olhando pra ele, agora com o rosto grudado no vidro, e com a essa chuva lá fora...
...só olhando você, sem dizer nada só olhando e pensando: Meu Deus, mas como você me dói de vez em quando!*
Na verdade, ele prefere ser exatamente este cara que eu vejo discretamente levantar agora. Mais um na multidão. Mais um no meio de tanta gente. Invisível aos olhos de tantos. Totalmente destacado aos meus. Me enxerga e já abre aquele sorriso que eu amo. Só que eu estou à frente e tenho que descer antes. Espero. Ele desce. Rimos. Então ele me diz:
- Abraça a sua loucura antes que seja tarde demais.*
- Minha loucura, por acaso, seria tu?



* Caio Fernando Abreu.

In: O ovo apunhalado. Porto Alegre: Globo, 1975; Morangos Mofados. São Paulo: Editora Brasiliense, 1982; Triângulo das Águas. Rio de Janeiro: Nova Fronteira, 1983; Pequenas Epifanias, crônicas (1986/1995). Porto Alegre: Sulina, 1996; Caio 3D - O melhor da década de 1980. Rio de Janeiro: Agir, 2005.

quinta-feira, 21 de fevereiro de 2008

'A Vida, o Universo e Tudo Mais'*


É estranho falar da minha relação com a religião. Cresci em uma família católica apostólica romana e nunca questionei a fé e as crenças. É claro que desde muito cedo, eu desenvolvi o 'meu jeito' de interpretar as passagens da Bíblia. Entretanto, tendo tantos amigos padres, freiras e afins, ficava fácil perceber que eu não estava errada em afirmar que a Bíblia não é um livro de histórias, mas um livro de simbologias, escrito em uma época em que a ciência não havia avançado o suficiente para explicar a vida, o universo e tudo mais*.

E então eu decidi ser cientista. E não foi uma decisão imatura, pois eu entrei na faculdade com mais de 20 anos. Na primeira universidade em que eu estudei a maioria das pessoas nem questionava ciência x religião, mesmo sendo uma instituição pública e laica. Quando voltei a Porto Alegre e novamente me encontrei em uma universidade laica, as pessoas da minha área tinham uma idéia totalmente diferente. Havia por aqui uma necessidade de se rotularem ateus ou agnósticos (que os ateus chamam de 'em cima do muro'). E mais: por parte dos ditos ateus, existia uma necessidade de provar que Deus não existe, ou que a religião prejudica o desenvolvimento das crianças, essas coisas...

Há dois anos eu estava fazendo uma disciplina chamada "Evolução Humana" e a última aula era sobre a evolução das crenças, mitos e religiões. Ao longo da aula pudemos constatar que mesmo os povos mais primitivos, antes mesmo do Homo sapiens, tinham rituais místicos e crenças em algum ser oculto ao qual por vezes prestavam homenagens e, em outras, demonstravam medo e respeito. Durante a aula, não houve um debate ferrenho entre meus colegas e professor ateus e eu. Eu só me declarei católica porque, em um dado momento, uma colega afirmava que religião era coisa pra pessoas sem conhecimento científico. Foi quando que eu perguntei se me considerava uma pessoa assim (não gosto de polêmicas, mas também não tenho sangue de barata!!!). O professor interveio dando exemplo de professores que igualmente tinham suas crenças e as praticavam sem deixarem de ser pesquisadores brilhantes. Criou-se um clima de constrangimento que eu imediatamente resolvi com um sorriso de 'está desculpada, pois tu não tens conhecimentos religiosos' e ficou tudo bem.

Porém, no último momento da aula, o professor (um dos maiores cientistas da América Latina, no alto de seus mais de 80 anos de sabedoria) resolveu terminar a aula com uma pergunta que percorreu o círculo de oito alunos começando à sua esquerda (eu estava à direita e fui a última). A questão era a seguinte: "É possível conciliar ciência e religião?". A maioria respondeu um simples não, contudo quando a pergunta chegou à colega da falta de conhecimento e blablablá, a resposta foi SIM! Ao que o professor, de pronto, perguntou: 'Por quê?'. E ela respondeu, olhando pra mim: 'Prova disso é a nossa colega’.

Pois bem, quando chegou a minha vez, a resposta foi um sonoro e decidido NÃO. A mocinha me mirou com cara de 'tá drogada?'. O professor sabiamente falou: 'Então explica'. E eu expliquei: 'Eu não disse que concilio as duas coisas, mas eu afirmo que consigo conviver com as duas'.


Se eu creio na existência de Deus e tu não acreditas, o ônus da prova é teu. Eu acredito e não preciso de prova nenhuma!**



* Expressão utilizada por Douglas Adams na série "O Guia do Mochileiro das Galáxias".



** Este é o desfecho de um segundo embate científico x religioso do qual eu participei.



PS: o post surgiu da conversa que eu tive com um ser que, semelhante a mim, parece não se acomodar com as idéias só porque alguém resolveu determiná-las como verdade absoluta.

domingo, 17 de fevereiro de 2008

Aos domingos...


Ela acorda tarde e, como sempre, liga a TV e fica passando os canais até achar algo que realmente interesse. Na verdade, nada vai interessar em um domingo de manhã na TV. Acontece que isso é praticamente parte do programa de um piloto automático que se apossa dela sempre que ela acorda: ligar a TV e procurar algo pra ter a desculpa de ficar mais um tempo na cama. Não quer sair de casa hoje e provavelmente recusar a convites pra almoçar. Não quer ser grossa com ninguém, apenas acha que a auto-companhia fará mais efeito num dia em que o calor promete assolar as ruas da cidade. Pretende ler algum livro, ouvir músicas, ficar sem fazer absolutamente nada. Come um resto de pizza fria da reuniãozinha de ontem à noite. Ao longo do dia, a solidão vai batendo e ela pega o telefone. Busca o nome na agenda e fica olhando... Não é uma emergência e ela prometeu a si mesma que só ligaria em caso de emergência absoluta. Então percorre a agenda toda a procura de alguém que possa acompanhá-la num sorvete na esquina. Tem que ser alguém que more pertinho, que não se importe em largar sua preguiça de domingo pra tomar um sorvete na esquina e que venha rapidinho antes que a vontade passe. Não há ninguém na agenda que preencha os requisitos. Na verdade há muita gente, mas ninguém com quem ela queira tomar o bendito sorvete na esquina. Pensando bem é uma emergência sim. Não há pessoa disponível pra tomar o sorvete e está um calor infernal. Ele sabe das pessoas que poderiam fazer companhia. Desiste de ligar quando já tinha escolhido até o texto... Tarde demais, a sorveteria está fechada.

Ele acorda cedo e, como sempre, finge que ainda dorme pra não precisar interagir com ninguém. Não pode sequer ligar a TV pra ver na cama porque alguém o chamará pra alguma coisa chata, dessas que só se faz aos domingos, como cortar a grama ou dar banho nos cachorros. Já faz parte da rotina esse comportamento instintivo e ele nem pensa mais ao fazê-lo. Descobriu que acorda e sequer abre os olhos pra não ter o seu segredo descoberto. Revira-se na cama pensando no quanto gostaria de morar sozinho pra não ter que acompanhar os programas dominicais do resto da casa. Desce quase na hora do almoço e desculpa-se dizendo que é o único dia que pode acordar na hora que bem entender. Mal termina de comer e já se joga no sofá da sala de TV pra tentar encontrar algo que ajude o tempo a passar, mas na medida em que o tempo se esvai, vai sentindo aquele vazio tomar conta. Mesmo com o ruído todo em volta... mesmo com as intermináveis conversas fiadas sobre o cotidiano enfadonho das pessoas com quem mora. Nada daquilo lhe interessa. Nunca realmente interessou. Num impulso, pega o telefone e digita aqueles números que nunca ousou salvar na agenda. Pra que? Ele os sabe de cor desde sempre. Não vai ligar. Então pensa em chamar algum amigo pra dar umas voltas ou bater um papo em algum lugar, bebendo uma cerveja. Mas falar sobre o que? E com quem? Ele nem gosta de cerveja. E sabe perfeitamente que só tem vontade de falar com uma pessoa. Chega até a elaborar toda uma conversa sobre o quanto precisa ouvi-la, sobre o quanto está se sentindo perdido no meio daquela gente chata. Entretanto acaba se dando conta que esse mesmo papo já rolou outras vezes e que é sempre assim: quando se sente perdido, pensa em recorrer a ela. E ela já deixou claro que não é pronto-socorro, que nunca vai ser um contato para emergências.

Mais um domingo que acaba. E mais uma vez ambos os pensamentos estão em uma única frase: ‘Chega logo, segunda-feira!’

segunda-feira, 11 de fevereiro de 2008

"Nas trincheiras da alegria..."



Muitos foram os carnavais em que ‘me passei’ no interior... Sim, porque eu ‘me passava’ horrores nos quatro encontros da folia de momo.

No passado: Bebidas, galinhagens nos bailinhos, passadas incessantes nos QGs dos blocos onde os guris faziam seus aquecimentos (do verbo encher a cara) antes de chegar no clube. E no clube aquela decoração cafona e colorida, aquele monte de confete por todo o chão (e como é que alguns paravam dentro do meu sutiã quando eu tirava a roupa ao chegar em casa?), aquela luz toda na cara... Pra que tanta luz? Os casais de tiozinhos devidamente posicionados em seus camarotes com suas garrafas de whisky, seus baldes de gelo seu ‘gingado’ totalmente fora de ritmo! E as músicas? Oras e quem é que se importa com a bandinha? Podia vir marchinha, samba enredo, axé, frevo... Com os canecos cheios era o que menos importava. Obrigação era ver com quem os guris conversavam... Onde eles se posicionavam e daí escolher um lugar para estrategicamente nos posicionarmos também. Daqui a pouco era tudo uma só turma. ‘Vamos pro salão?’ ‘Aham!”E se formavam os casais mais bizarros possíveis, afinal era carnaval, tudo poderia ser perdoado! Em meio a essas estripulias estavam os caras por quem a gente realmente arrastava um bonde. Ou, como eu sempre dizia, por quem não tínhamos uma queda mas sim um abismo! Os ‘do coração’. Entrava ano e saía ano e todas já sabiam quem eram eles. Era o nosso ‘segredo em comum’. Uma mostrava pra outra e por uma razão que até hoje não se sabe, mal olhávamos pros rapazes. Às vezes um ‘oi’ tímido, mas na maioria das vezes nem isso. E a gente sentia aquele friozinho na barriga quando percebia que eles olhavam na nossa direção... E morríamos de chorar em algum cantinho escondido quando eles ‘pegavam’ alguém no baile.

Hoje em dia: Depois de anos sem saber o que era um bailinho no interior, eis que eu sucumbo aos convites e resolvo voltar. Parte da velha turma reunida. Hoje, moças formadas, mulheres independentes, cheias de experiências, com muita história pra contar... O ritual é quase o mesmo, mas não precisamos mais procurar os guris, eles já não têm pique pra se reunirem em QGs e beber até irem pro clube. Se bebem antes, caem e não chegam nem a sair de casa. Não há muita diferença entre os tiozinhos e nós, aliás, por que não compramos um camarote e ficamos de canto vendo a festa acontecer? As músicas já incomodam. Por que tanta marchinha e frevo? Não dá pra tocar só as ‘micareta musics’ que são as únicas que ouvimos na rádio a caminho do trabalho? Nada de casais bizarros. Se foi o tempo em que o carnaval podia ser facilmente esquecido. Agora, cairíamos na risada cada vez que lembrássemos de ter ‘ido pro salão’ com um abobado só por diversão. Aliás, ir pro salão? Nem pensar!
Hummmmm... E os 'do coração'? Quase todos casados. Com moçoilas locais. Aliás, o tempo não fez muito bem a eles... e nem a elas. Eles: barrigas de chopp imensas, cabelos prestes a desabar de suas cabeças, cara de quem comeu e detestou... Elas: roupas bregas, cabelos mal pintados e mal arrumados, cara de cansaço logo no início do baile.
Acho que somos mais felizes do que julgávamos que seríamos se nossos sonhos adolescentes viessem a acontecer. É... Santa Helena Rubinstein, rogai por nós! Sempre! Amém.



* ainda estou em viagem de carnaval.

** mudei o layout pra ficar mais 'alegrinho' aqui; tava sombrio...

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