quinta-feira, 21 de fevereiro de 2008

'A Vida, o Universo e Tudo Mais'*


É estranho falar da minha relação com a religião. Cresci em uma família católica apostólica romana e nunca questionei a fé e as crenças. É claro que desde muito cedo, eu desenvolvi o 'meu jeito' de interpretar as passagens da Bíblia. Entretanto, tendo tantos amigos padres, freiras e afins, ficava fácil perceber que eu não estava errada em afirmar que a Bíblia não é um livro de histórias, mas um livro de simbologias, escrito em uma época em que a ciência não havia avançado o suficiente para explicar a vida, o universo e tudo mais*.

E então eu decidi ser cientista. E não foi uma decisão imatura, pois eu entrei na faculdade com mais de 20 anos. Na primeira universidade em que eu estudei a maioria das pessoas nem questionava ciência x religião, mesmo sendo uma instituição pública e laica. Quando voltei a Porto Alegre e novamente me encontrei em uma universidade laica, as pessoas da minha área tinham uma idéia totalmente diferente. Havia por aqui uma necessidade de se rotularem ateus ou agnósticos (que os ateus chamam de 'em cima do muro'). E mais: por parte dos ditos ateus, existia uma necessidade de provar que Deus não existe, ou que a religião prejudica o desenvolvimento das crianças, essas coisas...

Há dois anos eu estava fazendo uma disciplina chamada "Evolução Humana" e a última aula era sobre a evolução das crenças, mitos e religiões. Ao longo da aula pudemos constatar que mesmo os povos mais primitivos, antes mesmo do Homo sapiens, tinham rituais místicos e crenças em algum ser oculto ao qual por vezes prestavam homenagens e, em outras, demonstravam medo e respeito. Durante a aula, não houve um debate ferrenho entre meus colegas e professor ateus e eu. Eu só me declarei católica porque, em um dado momento, uma colega afirmava que religião era coisa pra pessoas sem conhecimento científico. Foi quando que eu perguntei se me considerava uma pessoa assim (não gosto de polêmicas, mas também não tenho sangue de barata!!!). O professor interveio dando exemplo de professores que igualmente tinham suas crenças e as praticavam sem deixarem de ser pesquisadores brilhantes. Criou-se um clima de constrangimento que eu imediatamente resolvi com um sorriso de 'está desculpada, pois tu não tens conhecimentos religiosos' e ficou tudo bem.

Porém, no último momento da aula, o professor (um dos maiores cientistas da América Latina, no alto de seus mais de 80 anos de sabedoria) resolveu terminar a aula com uma pergunta que percorreu o círculo de oito alunos começando à sua esquerda (eu estava à direita e fui a última). A questão era a seguinte: "É possível conciliar ciência e religião?". A maioria respondeu um simples não, contudo quando a pergunta chegou à colega da falta de conhecimento e blablablá, a resposta foi SIM! Ao que o professor, de pronto, perguntou: 'Por quê?'. E ela respondeu, olhando pra mim: 'Prova disso é a nossa colega’.

Pois bem, quando chegou a minha vez, a resposta foi um sonoro e decidido NÃO. A mocinha me mirou com cara de 'tá drogada?'. O professor sabiamente falou: 'Então explica'. E eu expliquei: 'Eu não disse que concilio as duas coisas, mas eu afirmo que consigo conviver com as duas'.


Se eu creio na existência de Deus e tu não acreditas, o ônus da prova é teu. Eu acredito e não preciso de prova nenhuma!**



* Expressão utilizada por Douglas Adams na série "O Guia do Mochileiro das Galáxias".



** Este é o desfecho de um segundo embate científico x religioso do qual eu participei.



PS: o post surgiu da conversa que eu tive com um ser que, semelhante a mim, parece não se acomodar com as idéias só porque alguém resolveu determiná-las como verdade absoluta.

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